segunda-feira, 14 de novembro de 2016

A DELEGADA GOIANA QUE ROMPEU UM TABU



Mudança de sexo parece ter pegado de surpresa os colegas da Polícia Civil. Comentários internos da corporação dão conta que Thiago, agora Laura, era bastante "másculo" para "chegar ao ponto" de virar mulher.

Reprodução/Facebook













A transexualidade, diferentemente da homossexualidade, é um assunto ainda pouco discutido no meio social e midiático. O espaço que os transexuais possuem na sociedade é ínfimo em relação a outras minorias sociais. Em Goiás, a delegada de polícia Laura de Castro Teixeira, antes Thiago de Castro Teixeira, resolveu realizar o procedimento cirúrgico para mudar de sexo. Após processo de relocação de delegados da Polícia Civil, ela deverá integrar em fevereiro a equipe da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam-Goiânia).
A notícia parece ter pegado de surpresa os colegas da corporação. Os comentários internos da Polícia Civil dão conta que Thiago era “bastante másculo” para “chegar ao ponto” de se tornar um integrante do sexo feminino. Roupas masculinas e a barba por fazer davam crédito total à masculinidade da agora delegada. Inclusive, Laura já foi casada com uma mulher, com quem teve dois filhos.
O delegado adjunto Daniel Felipe Adorni da Diretoria da Polícia Civil de Goiás afirmou que a corporação goiana enxerga o caso com “naturalidade”. “Para nós, problema é policial corrupto, truculento, omisso", declarou. O delegado acrescentou também que as mudanças de sexo e de nome da delegada não alteram seu vínculo com a corporação, visto que a situação jurídica de Laura permanece inalterada.
A advogada Chyntia Barcellos, vice-presidente da Comissão Especial da Diversidade Sexual do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e presidente da Comissão de Direito Homoafetivo da Seção de Goiás da OAB, comemorou a notícia. “Sinto uma alegria imensa de poder presenciar esses avanços, especialmente por ser na minha cidade, Goiânia. Acredito que esta história incrível servirá de exemplo para outras pessoas que têm o mesmo desejo, mas preferem não mudar de sexo por convenções sociais”, analisa Chyntia.
Laura já se transformou em um exemplo na luta pela causa homossexual. Liorcino Mendes, presidente da Articulação Brasileira de Gays (Artgay), afirmou via rede social que o movimento LGBT de Goiás fica feliz com a notícia e vê um avanço importante no caso da delegada. "Parabéns, Goiânia tem a primeira delegada de Polícia Transexual do Brasil. Viva as mulheres transexuais", publicou na sua página do Facebook.

Transgenitalização e a hipocrisia social 
A sexualidade humana é muito mais complexa e peculiar do que uma inocente divisão em duas partes. Entretanto, o ser humano nasce em “caixas sociais”, ou você pertence ao sexo masculino ou feminino. Meninos gostam de meninas, e casam com elas; esta é a lógica. Relacionar-se com pessoas do mesmo sexo já é “problema” o suficiente; almejar a genitália alheia então... um sacrilégio dos mais desagradáveis.
A transexualidade é encarada pelos fanáticos religiosos (ou nem tão fanáticos) como uma “abominação”, e grande parte da população avalia a condição como um simples processo de automutilação. Optar pela troca de sexo não é uma decisão tomada da noite para o dia. Além do preconceito (dos outros e de si mesmo) e da fobia social, transexuais passam a vida ingerindo medicamentos que controlam a taxa hormonal.  Não é simplesmente “colocar” ou “tirar” algo.
As pessoas que desejam a transgenitalização conhecem os riscos e as consequências do procedimento, e, mesmo assim, decidem fazê-lo; não por capricho, mas porque a dor de pertencerem a um corpo que não o seu é muito maior do que as dores de um procedimento cirúrgico.
Se um erro biológico ou divino, o fato é que transexuais necessitam de auxílio médico por toda a vida, e também psiquiátrico. Mas não apenas no momento em que resolvem realizar a transgenitalização. Impossibilitadas de expressarem sua real condição sexual, elas são obrigadas a passar grande parte da vida sendo quem não são, e para ser quem querem ser necessitam de condições financeiras asseguradas. Muitas, oriundas de famílias humildes, não possuem condições de realizar a cirurgia e acabam enveredando pela prostituição. Não que este seja um caminho “indigno”, mas o fato é que a fobia social para com as transexuais não lhes dão muitas opções. 
O mercado de trabalho é vedado às transexuais, salvo raras exceções - como é o caso da delegada goiana. Marginalizadas e esquecidas pelos familiares, as oportunidades de emprego são escassas. Pense bem! Quantas professoras ou médicas transexuais você conhece? Você já contratou alguma para trabalhar em sua casa ou em sua empresa?
Também por esse motivo a coragem da delegada deve ser louvada e prestigiada. Ela conseguiu romper paradigmas ainda presentes nas forças oficiais, onde a homossexualidade e a transexualidade não têm vez, pois, remetem à ausência de virilidade - visão esta que se desvencilha do real com a presença feminina massiva em cargos de comando.
Assim como tantas outras minorias que ganham o seu espaço em sociedade, as transexuais merecem ser aceitas e respeitadas. Elas são, sem “mas”, mulheres, e, como tais, devem ser incluídas em todas as conquistas alcançadas pela classe feminina ao longo dos anos. A mudança de sexo já é possível faz tempo, o que falta agora é a mudança de mentalidade. 

Reportagem retirada na íntegra:

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